sábado, outubro 25, 2003

Homem-Máquina

O motor trabalha, atrapalha o silêncio
o seu matraquear na minha cabeça, vem já de dentro, ritmado
dou por mim a tremer com ele
Sou homem-máquina já
acelero a vida, travo na curva da evolução,
meto uma abaixo, meto-me em baixo
Ultrapasso o espaço que me segue
passo num cruzar de estradas vivas
Estou no red-line, grito já num todo
Estou a rebentar...
Metes-me outra?
Estou esgotado;
Esta estrada que me leva a sitio nenhum, não acaba
acaba comigo, sozinho aos gritos.
Fujo, acelero, fujo do tempo-espaço que sobranceiramente me aperta e trava.

Vejo uma silhueta ao fundo, És tu?
O seu dedo espetado grita auxilio, trava o grito... Estanco num bater calmo.
Abri-lhe a porta. Entrou, calma... quase fria, numa simples música falou.
Meto primeira, largo...
Meto segunda, sigo...
Terceira engrenada, sincronizo a música no grito, já não grito, sigo.
Tenho música numa estrada sem sitio onde ir.
Já há música!
Sigo até ao fim da viagem...
Queres vir também?

à C.S.

sexta-feira, outubro 24, 2003

À espera

A cadeira
sentada no canto da sala
espera
uma mão, um corpo
o peso do corpo

A mesa
cansada no centro
desespera
pratos riscados
talheres tresmalhados

O quarto
enche de silêncio
deixou a vida sair
de dia, todos os dias

A criança
espera no canto
de uma sala
pelo corpo passado
de um dia pesado
num silencio riscado

A casa
aguarda
no silencio
corpos, cadeiras, mesas, crianças, quartos
vida

Entrem e encham o silencio
com outros dias de vida...

qUADRO dADO

Arrebatação,
tenho um quadro.. tenho uma tela cansada de esperar por um pincel que não chega,
Sentimento contraditório, enquanto estiver em mim a urgência de o acabar, vai ele acabando comigo...
Não me deixa, mas não me solta...
Alguém é capaz de lhe segredar ao ouvido?
Tenho o quadro dado, sem nunca o dar...
D`ar vive a esperança de lhe tocar...
Rasgar-lhe o branco, sangrar-lhe o interior de cor...
raspar-lhe a perfeição agarrada
Ah! doi-me pensar em pintar, tenho uma voz que fala onde o silêncio me grita...

Tempo100Tempo

Entre a vida que tive
e a que não tive
Entre a que queria e não tenho
Entre o tempo
Balanço no tempo
que é meu
Oscilo num tempo
Num tempo dentro do tempo
num tempo fora de tempo
uma vida que não tenho
Sonho o pesadelo
Vivo o tempo sem tempo
deixo o tempo a tempo
Vivo o momento...

quinta-feira, outubro 23, 2003

Banco de Tempo

Sentado num banco do tempo
Voo de estacao em estacao
em ocasos de vida
deixo par trás
Faz-me avançar
Mais outra
Entro nesta personagem
como quem despe outras vidas
e veste o presente
Sentado no banco
de um tempo só meu
Olho a janela
vejo-me
vejo vidas lá fora
e presas no cristal
o oposto externo
Olho-me
e por momentos
visto também outra
vida que nao a minha
Contorco-me na memoria
de um olhar trocado
de um cheiro culpado
Calcado pelo tempo
intercalado
um caleidoscopio de sensaçoes
todas sao uma vida ja
passada
revista nos pequenos ponteiro
que insistem em nao parar
Estou quedo
num movimento vitreo
A cena passa todos os dias
diferente
no mesmo teatro da vida
No seu crepusculo, um final
cobreado... soltam-se ja
pinceladas de negro
Neste momento onde o rubreo
disforma a vista
incandeia pedras e ferro
como grito final
dum encantado azul-violeta
que o estrangula e empurra
Para baixo.

dedicado a C.S.

A.deus

Levantam,
Levantam-se à  minha passagem,

Gritam um último adeus,

Suspiram pela última vez,
Faz já umas horas que o sangue lhes deixou...

Uma sensação,
Uma vida,
Uma imagem...

Morreu nelas
Vive em mim.

Como por magia...
lembro o seu cheiro molhado
pela memória de uma passagem
em tons vermelho e negro...
rasgados...
metálico papel
escrito no tempo
escrito no ar

enferrugas já...
senti-te desfalecer
desvanecer...
imagem tosca agora...

A imagem toca agora...
Folhas que jazem no chão de uma memória...

Para C.S.