terça-feira, novembro 23, 2004

Chimoio

O bolo deixava um travo amargo dentro,
deixara-mo acompanhado de um sorriso, não sabíamos como reagir...
Tinha pedido dois cafés, acompanhados da fatia de chocolate feito bolo.
O Júlio , preto desde que se vira a primeira vez no Chimoio, lá longe, ficara sorridente ao pousar os olhos no meu rosto, retribui.
Sentamo-nos na mesa do canto, ao lado a Ti Rosa e as suas mezinhas, ajudava almas, cultivava o terreno mais difícil de manter, vendia fé, os doutos chamavam-lhe de efeito placebo, eu chamava-lhe fé, não a tinha era certo!, mas havia quem a estivesse a perder e desenfreadamente a buscasse num prato ao fundo da mesa de cabeceira ou naquela mistela aquosa do copo bebido, e assim estava ela, a Ti Rosa, sentada na sabedoria, com os cotovelos na fé e os olhos no medo, sorria, naquele sorriso negro que lhe marcava o rosto. Ao fundo o som do futebol, na lareira a cavaqueira comprometida das chamas, e no prato o bolo. Aquele pedaço escuro como África, doce como tu, dado, negado ao dinheiro, só, assim! Dado.
Estranhámos, comemos, fartámos.
O Júlio deixara, e com ele o pudim, o bolo de laranja, a tarte de maça, tudo... tudo abraçado ao pedido de dois cafés, não estávamos ali, tínhamos subido, tínhamos ultrapassado, deixamos atrás a civilização, a "Civilização"! Onde tudo tem um preço, onde tudo custa algo, onde o desabafar amigo se chama consulta, onde o carinho, se chama terapia, onde o beijo é interesseiro, onde tudo é falso, isto sim! Era a civilização onde corríamos e vivíamos, mundo ocidental! Ali naquele canto rimos, unimos e deixamos...
sorrisos quentes do Chimoio aqui em Portugal...
Sim, sou racista! Cada vez mais. Cada vez mais detesto humanos civilizados.
A origem, o simples, o sorriso, a mão que nos ajuda a levantar na queda e tudo sem ter um preço, só porque sim! Isso sim faz sentido!
O resto... o resto?